
A discussão sobre a obrigatoriedade da inscrição dos advogados públicos na OAB reacendeu intensamente no Supremo Tribunal Federal. Em tese, quem exerce função estatal após concurso estaria dispensado de registro profissional. Contudo, o cenário constitucional e jurídico aponta para outra lógica.
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Enquanto profissionais que atuam diretamente na defesa jurídica dos entes públicos, os advogados públicos exercem plenamente as atividades privativas da advocacia, conforme definidas pela Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia).
Sentido constitucional da advocacia
A Constituição Federal não estabelece distinção entre advogados públicos e privados ao se referir genericamente à advocacia. O artigo 133 da CF consagra que “o advogado é indispensável à administração da justiça", sem fazer ressalva quanto à natureza do vínculo com a Administração Pública.
Neste sentido, o exercício profissional da advocacia está condicionado à inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, cuja função não é apenas registrar, mas também regular e fiscalizar a prática da advocacia como serviço público e função essencial à Justiça.
Mesmo os que exercem cargos mediante concurso público e servidores estatutários, como procuradores municipais, estaduais e federais, devem respeitar os requisitos da profissão, entre eles a necessidade de aprovação no exame da OAB e sua respectiva inscrição ativa.
Comparativo com outras profissões reguladas
A exigência de inscrição em conselhos profissionais é realidade consolidada em diversas carreiras. Um médico precisa de registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) para atender, ainda que em hospital público. Da mesma forma, engenheiros necessitam do Crea, mesmo quando contratados em instituições estatais.
Analogamente, não faria sentido dispensar da OAB justamente os advogados públicos, que demandam prerrogativas típicas da advocacia, como o sigilo profissional, a inviolabilidade de seu local de trabalho e a autonomia técnica nos pareceres jurídicos.
Participação no quinto constitucional
Outro aspecto relevante diz respeito à possibilidade de participação nas listas do quinto constitucional. O artigo 94 da Constituição prevê que um quinto das vagas nos tribunais deve ser destinado à advocacia, por meio de lista sêxtupla organizada pela OAB.
Sem registro na entidade, o advogado público estaria excluído do processo de indicação, já que apenas podem figurar nessas listas aqueles membros efetivos da Ordem que tenham, no mínimo, dez anos de atividade jurídica comprovada.
A ausência de vínculo institucional com a OAB comprometeria a legitimidade da candidatura ao quinto, gerando insegurança jurídica, inclusive sobre a representatividade da advocacia nos tribunais.
Incoerência interpretativa e isonomia
No julgamento da ADI 6.810, o STF majoritariamente consolidou o entendimento de que a OAB pode, dentro da sua autonomia, estabelecer critérios objetivos de tempo de inscrição e atuação regional para candidatos ao quinto. Assim, permitir que advogados públicos não inscritos possam ser indicados às listas sêxtuplas vai contra a lógica já firmada da exigência de pertencimento formal aos quadros da entidade.
Além disso, tal diferenciação violaria o princípio da isonomia profissional. Advogados que atuam no setor privado continuam obrigados à inscrição ativa para exercer exatamente as mesmas funções técnicas que seus colegas do setor público. Não há justificativa constitucional para esse tratamento desigual.
A defesa institucional oferecida pela OAB
A inscrição na OAB também é condição para acesso às prerrogativas profissionais garantidas pela entidade. Casos como a não responsabilização por pareceres, o direito ao recebimento de honorários advocatícios e a proteção prática em episódios de violação de prerrogativas só são viáveis quando há registro ativo do profissional na Ordem.
Como lembra o presidente da OAB Nacional, Beto Simoneti, a ausência desse vínculo institucional enfraquece a defesa da classe e inviabiliza a atuação orgânica da entidade em prol das garantias funcionais dos advogados públicos.
Competência legal e ausência de exceção normativa
O Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994), legislação infraconstitucional disciplinadora da carreira, exige a inscrição na OAB a todos os que pretendem exercer a advocacia — não havendo exceção que permita aos advogados públicos atuarem legalmente fora dessa regra.
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, já reconheceu que a advocacia pública integra o modelo das funções essenciais à Justiça, sendo impossível dissociar sua prática da regulação exercida pela OAB.
Sem uma norma expressa que excepcione a exigência, considerá-los dispensados da inscrição implica criar uma regra que a lei não permite, como alertam os ministros Nunes Marques e Edson Fachin.
Considerações finais
O debate não gira em torno apenas de um aspecto burocrático. Trata-se da coerência sistêmica do ordenamento jurídico e da manutenção da unidade da profissão de advogado, seja na iniciativa privada ou no setor público.
Permitir a atuação de defensores, procuradores e outros advogados públicos sem inscrição ativa na OAB fragilizaria o conceito de advocacia como um todo, criaria disparidades injustificáveis e comprometeria, inclusive, os mecanismos constitucionais como o quinto constitucional.
A inscrição na OAB não é apenas um requisito formal, mas o verdadeiro elo jurídico e institucional que confere legitimidade à prática da advocacia em qualquer esfera — incluindo a pública.
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Redação
Redação jornalística da Elias & Cury Advogados Associados.